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Mostrando postagens de julho, 2019

"Bota a cara pra morrer"

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TRATRATRATRAAAAAAA TRATRATAAAATRAAAAAA Rajadas de tiros. Mais tiros... Muitos... Cruzavam riscos vermelhos de um lado para o outro. No dia seguinte o mais do mesmo. Outro corpo jogado no lixo da descida da ladeira. Às vezes não tinha corpo. Eram pedaços, partes disformes que poderiam ser braços e pernas. Lembro do homem, meio roxo, meio preto, sem cabeça. Uma desova feita pela madrugada e exposta em plena luz do dia. Já não me chocava. Antes eu olhava com curiosidade misturada com medo. Depois passava tranquilamente apenas evitando aquele lado direito da rua quando descia para ir à escola. Antes eu achava que eram bandidos. Diziam que era guerra entre facções e que os caras do outro morro tinham tentado invadir. Se deram mal.  Só vim a entender o que acontecia ali depois que sai de lá e vim morar perto de outro morro. Um pouquinho mais afastada com o status agora de quem não tá no pé da favela. O distanciamento da violência sentida nos ouvidos com o pi

Um dia comum…

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              Aquela noite iniciava como de costume, nada de novidade, mesmo assim o coração acelerado e no estômago o vazio de sempre. Por mais simples e corriqueira que a atividade fosse, ansiedade e insegurança se faziam presentes como um molde que caracteriza atividades dignas de remuneração. Fiz tudo como de costume, cheguei uma hora antes, o prédio grande repleto de grades estava quente, silencioso e com algumas grades trancadas dividindo o espaço possível de ser utilizado, fora do horário normal de aulas. Nesse horário mal se podia imaginar que crianças correm e gritam por esses mesmos corredores o dia todo, facilmente poderia ser confundido com uma fabrica a não ser por uns poucos trabalhos dependurados nas paredes e pelas salas, que vazias de pessoas, parecem (maiores do que são com carteiras e cadeiras enfileiradas.             O cheiro de comida sendo preparada invadia os corredores e se misturava com o calor do final do verão e com a fome, presente no momento que prece

"O céu vai cair e vai acabar tudo."

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(...) O tempo ocidental é o tempo da produção, do acumulo, da riqueza, do futuro. (...) O tempo indígena, no entanto, é o tempo da natureza e a natureza, como dizia Charles Darwin, não dá saltos – Natura no facit saltus , ele dizia. É o mesmo que dizer que a natureza segue uma lógica que responde às suas próprias necessidades. O tempo do corpo é o tempo da natureza. Respeitar este tempo é oferecer ao corpo tudo o que ele precisa para viver com equilíbrio. Assim, o corpo segue o tempo de suas necessidades obedecendo a circularidade que a própria natureza lhe desperta. Vale lembrar que ao refletirmos sobre isso nos colocamos dentro da natureza como parte dela. É assim que os indígenas se sentem em suas diferentes formas de humanidade. (MUNDURUKU, p.2, sd).   Como professor de história da rede pública da educação básica, sempre iniciei minhas aulas com indagações para a turma – fossem elas do 6° ano do EF II ou 3º ano do EM – sobre o que é História, mito, fontes históricas, narrati
Algumas reflexões sobre estudos decoloniais e audiovisuais Marinilde Tadeu Karat Confesso que tive uma grande resistência em fazer essa disciplina e que não conseguia perceber qualquer aproximação dos estudos decoloniais com a pesquisa que estou fazendo no doutorado. Quando me inscrevi na disciplina tinha lido uns dois ou três artigos que a minha orientadora recomendou e participado de uma disciplina de 3 dias durante um evento do programa de pós-graduação. Durante a disciplina tive a oportunidade de conhecer um pouco mais sobre essa literatura e através das leituras e discussões realizadas com professores e colegas, pude perceber a importância de conhecer esse referencial e entender que mesmo que ele não seja um dos referenciais teóricos da minha tese, é um referencial importante para minha formação como pesquisadora na área de educação científica e tecnológica.  O objetivo geral da minha pesquisa é compreender os sentidos sobre ciência e tecnologia produzidos por professores a

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É tempo de escrita. Sistematizar as reflexões produzidas a partir da disciplina e, mais que isso, estabelecer relações, potencializar outros pensamentos, narrativas e possibilidades de (re)ver a mim mesmo sempre foi um movimento que percebi. Este texto, em alguma medida, faz isso. Ao longo da minha trajetória como professor de Biologia, que em abril de 2019 completou 12 anos, em diversos espaços educativos me percebi construindo uma identidade docente. Que mudou, e mudou novamente, e outra vez, e de novo... Um constante (re)pensar naquilo que eu acreditava e fazia. Eis que ao longo desse processo me questiono se - de fato - aquilo que eu desenvolvia em aula era mesmo Biologia. Foi então que ao encontrar os estudos decoloniais eu consegui (re)conhecer aquilo que estava fazendo a partir de um suporte teórico. Pensar a partir de um ensino outro, que pensa o ensino de Biologia desde outro ponto de partida parece ter potencial, no meu entender, para contribuir em questões que jul

Abrindo e descolonizando caminhos

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Abrindo e descolonizando caminhos                 Ao participar da disciplina condensada “Estudos Decoloniais, Epistemologias do Sul e Temáticas Sócio-ambientais” não tive como não pensar na minha história e caminhos percorridos. Todas as discussões e questões levantadas, bem como os textos lidos e debatidos, foram de enorme importância e contribuição nas minhas reflexões e formação enquanto Ser, mulher, professora e pesquisadora. Cresci em uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, chamada Estrela. De colonização alemã, por ali vivi durante 17 anos. De uma família tradicional e privilegiada, fui educada e padronizada aos moldes mais tradicionais. Eu, mulher, branca, cis-hetera, vivia em uma bolha da sociedade. Estudei em um colégio particular de uma rede de ensino evangélica luterana. Nesse lugar, ninguém falava sobre corpos. Eu não tive colegas negras. Pardos. Indígenas. Nada. Tudo era normativo. Violência? Não lembro. Realidade social, injustiças, só nós livros didáticos.

Meu corpo feminino é político

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Por tradição, após nossas aulas no PPGECT tomamos uma cerveja. Foi no Iega que minhas amizades mais profundas nasceram. Aprendi, na experiência de dias frios em Floripa, que o espaço de convivência fora da Universidade é mais importante do que o que fica para dentro de seus muros.  E estávamos ali, após a aula da disciplina condensada, naquele bar que nem existia na época em que era doutoranda, falando sobre nós,  mulheres, e nossas experiências em relacionamentos com homens. Nesse ambiente a gente pode falar alto, pode rir alto e pode falar sobre assuntos que geralmente não ousamos nem tocar quando dentro da universidade. Conversávamos sobre sermos obrigadas a ceder nossos corpos para o prazer do homem. Todas nós (estávamos em seis) já tínhamos sido estupradas por nossos ex-companheiros. Sim, o termo correto é estupro. Quando fazemos sexo sem consentimento, mesmo quando a gente gosta do cara, é estupro.  O único homem que estava conosco ficou estupefato. Eram 3 gerações de mu

Relato/Considerações sobre a minha participação na Disciplina.... (Por Silvana Leonora Lehmkuhl Teres)

A participação na disciplina “Estudos Decoloniais, Epistemologias do Sul e Temáticas Socioambientais da ECT” foi uma experiência que me oportunizou as primeiras reflexões sobre a diferença entre os conceitos de colonialismo e colonialidade ; e também a respeito dos estudos decoloniais, pós-coloniais e da interculturalidade crítica. Sobre a distinção entre colonialismo e colonialidade, Nelson Maldonado-Torres (2007), faz a seguinte argumentação: O colonialismo denota uma relação política e econômica, na qual a soberania de um povo está no poder de outro povo ou nação, o que constitui a referida nação em um império. Diferente desta ideia, a colonialidade se refere a um padrão de poder que emergiu como resultado do colonialismo moderno, mas em vez de estar limitado a uma relação formal de poder entre dois povos ou nações, se relaciona à forma como o trabalho, o conhecimento, a autoridade e as relações intersubjetivas se articulam entre si através do mercado capitalista mundial e da